sexta-feira, 27 de abril de 2012

O NCN no STF, quando o Brasil ganhou do DEM


Por: Leandro Salvático

Representei o Núcleo de Consciência Negra da USP no SuperiorTribunal Federal (STF) no dia 26 de Abril de 2012, durante o julgamento da liminar aberta pelo Partido Democratas (DEM) contra as Cotas Raciais implementadas na Universidade Federal de Brasília (UnB). Cotas esses, em vigor desde 2004 como um esforço admirável daquela Universidade para eliminar as injustiças praticadas no Brasil contra as minorias.

O julgamento das Cotas Raciais no STF era aguardado tanto por aqueles que lutam contra o racismo e a desigualdade sócio-étnica-racial quanto pelos que lutam pela continuidade (ou eternalização/perpetuação) do status-quo, no qual uma etnia (numericamente minoritária) domina as vagas nas melhores universidades, no mercado de trabalho especializado e os cargos políticos do país. O julgamento teve início com um voto do Ministro-Relator do processo, Ricardo Lewandowski, favorável às Cotas e quando chegou a vez (e o voto) do Ministro Joaquim Barbosa, o placar já estava 4 votos para as Cotas e nenhum voto para o DEM.

 O primeiro e (até o momento) único negro do STF, Ministro Joaquim Barbosa, chamou para si a palavra e com base em um texto escrito por ele próprio em 2001, deu um show de Direito Constitucional à Plenária, trazendo à tona o fator motivador da Ação do DEM no STF, que é nada mais, nada menos do que interesses particulares de uma elite que quer a todo custo manter o poder que detém, mesmo que para isso tenham que deixar inúmeras gerações sem acesso ao desenvolvimento social brasileiro e mundial (não seria esse o interesse da elite?).

O voto número cinco colocou o Brasil a apenas um voto de distância da legitimidade jurídica das Cotas, pois a legitimidade científica ela tem há décadas, e fez com que algumas (poucas) pessoas do DEM presentes na sala, começassem a se retirar. As lideranças do Movimento Negro permaneceram na Plenária, apreensivas. Eram dezenas de pessoas vindas de todo o Brasil, e assistiram ao momento em que o Ministro Celso Pelluzo foi chamado e conclamou a constituição brasileira para afirmar em alto e bom som que as ações afirmativas são plenamente constitucionais, citando exemplos como a Lei Maria da Penha para apontar diferenças positivas, e apontando para o fato de que o tratamento diferenciado de minorias está previsto na Constituição Brasileira.

Antes de finalizar, ele atacou um a um os argumentos racistas utilizados pelo DEM de que “as Cotas vão gerar discriminação” (uma vez que não existe nenhum dado empírico que confirme isto) e o de que “as Cotas atacam o mérito” (pois não existe mérito quando se compara de forma igual dois pessoas que não tiveram oportunidades iguais ou similares). O racismo caiu de joelhos, a farsa do meritocracia foi junto pelo ralo e as Cotas Raciais pelas quais os Movimentos Sociais tanto lutaram para implementar haviam vencido essa batalha. Houve uma comemoração silenciosa, e porque estávamos dentro do STF, mas muito intensa, com abraços, sorrisos  e palmas de surdo! Muitas!!! Foi lindo! Eu jamais esquecerei aquele momento...

O voto número seis deu a vitória ao Brasil.. sim, ao Brasil...não somente aos negros brasileiros, pois a população não-negra terá o prazer de disfrutar um ambiente universitário mais diverso em termos sócio-étnico-racial e cultural, e vamos aprender muito mais com isso. Sem dúvida, o Brasil ganha com isso. O avanço na implementação das Cotas em todas as Universidades do país, principalmente nas numéricas e simbolicamente grandes como a USP, vai ocorrer e farão com que nossos filhos brancos, negros, amarelos, indígenas, sejam pessoas mais sábias, mais tolerantes e capazes de construir um país com oportunidades para todos e todas.

O julgamento no STF decidiu unanimimente a favor das Cotas e aconteceu na mesma semana que o Núcleo de Consciência Negra protocolou o pedido dos dados do Programa de Inclusão da USP, o INCLUSP, para desenvolver um projeto de pesquisa sobre o tema, projeto esse que contará com a participação dos maiores pesquisadores do Brasil na área de Inclusão Social.

Conseguimos duas vitórias contra o racismo a menos de um mês do NCN completar 25 ANOS. E com base na nossa história de luta, experiência e conhecimento adquiridos ao longo dessa jornada que por tantas vezes fez ecoar o grito de “COTAS NA USP JÁ!”, questionamos você, leitor: O INCLUSP é mais eficaz para gerar inclusão social que o sistema de Cotas Raciais implementado na UnB e em outras tantas Universidades Brasileiras, para gerar inclusão?

Essa resposta ninguém (ainda) tem, mas com o avanço da ciência sobre o preconceito e conservadorismo, afirmo que não tardará a chegar o dia em que A USP VAI FICAR PRETA! Muito PRETA! Se você duvida da eficácia das Cotas, convide o NCN e nossos aliados para fazer esse debate com você, Doutor. Para quem não sabe, o Núcleo de Consciência Negra na USP foi a 1ª Entidade Política do Brasil a pautar Cotas nas Universidades como meio Reparação Histórica ao Povo Negro! No início da década de 90... Vencemos porque argumentos científicos (estatísticos, históricos, sociais e jurídicos) aqui não faltam... e aí?